Méritofalácia
Os latinos de um modo geral não gostam de ser avaliados, porque tem dificuldade em separar as emoções da razão; muitas vezes confundem uma avaliação de resultados menos positiva com a falta de consideração pessoal do avaliador.
Essa condição cultural faz com que a nossa relação com o trabalho seja menos objetiva e rigorosa e consequentemente sejamos mais condescendentes com a ineficiência e a ineficácia, privilegiando freqüentemente o valor dos argumentos à expressão dos resultados.
Sendo assim, a gestão por objetivos e a avaliação de desempenho é muitas vezes hostilizada pelos nossos gestores e empregados, relevando o seu impacto nas empresas e organizações. Apesar disso, essa rejeição é muitas vezes legítima perante as farsas de avaliação de desempenho a que são freqüentemente sujeitos.
A primeira grande questão é se faz sentido implementar hoje em dia um simples processo de avaliação de desempenho versus um processo de gestão de desempenho?
Os processos de avaliação de desempenho foram banalizados nos últimos cinqüenta anos nos países mais desenvolvidos, já foi há muito substituídos por processos de gestão de desempenho, no entanto muitos dos nossos gestores ainda discutem se os vão implementar ou não, como se isso fosse a ultima das maravilhas da gestão do século XXI.
A avaliação de desempenho é reativa face aos resultados, visa apenas à avaliação do passado, enquanto que os processos de gestão de desempenho visam, sobretudo, monitorar continuamente o desempenho de forma a garantir e maximizar esses mesmos resultados, e por isso tem um impacto muito mais significativo na produtividade e competitividade das empresas e organizações.
Como é sabido muitos dos nossos gestores apesar de terem modernizado significativamente o seu vocabulário padecem de um grande déficit de competências de gestão, e por isso ainda se assumem mais como “chefias” do que como “gestores/lideres”.
O perfil do “avaliador de desempenho” é o de “chefia”, e o perfil do “gestor de desempenho” é o de “gestor/líder” (lato senso, nomeadamente gestor de pessoas), por isso muitos dos nossos gestores sentem-se mais “confortáveis” com os processos já ultrapassados de avaliação do que com os de gestão de desempenho.
Qualquer modelo de gestão de desempenho que não seja “top down” para toda a organização, está condenado a ser um instrumento de gestão inconseqüente e ineficaz, porque o desempenho da organização é obviamente resultante do desempenho de todos os gestores/lideres e de todos os subordinados em interação sistêmica entre si, e não como agentes isolados.
Outra questão importante é o que deve ser avaliado. Muitos preferem avaliar apenas resultados numéricos, por serem mais objetivos, outros são adeptos da avaliação exclusiva de competências, defendendo que a avaliação de desempenho deve servir sobretudo para identificar necessidades de desenvolvimento.
Mas o conceito de gestão desempenho só poderá ser plenamente implementado se os objetivos quantitativos e qualitativos forem simultâneos, ou seja, com a definição dos objetivos quantitativos, especificamos “o que deve ser realizado” e com as competências ou objetivos qualitativos definimos “como deve ser realizado”, e só assim poderemos monitorar continuamente o desempenho e corrigir atempadamente o que for necessário para garantir e maximizar os resultados esperados.
Embora pudéssemos analisar muitos outros fatores fundamentais para a eficácia dos processos de gestão de desempenho, sublinho apenas mais um: a qualidade técnica do instrumento de gestão, nomeadamente quanto ao método da correção de iniquidade e subjetividade da avaliação, e consequentemente quanto à confiabilidade dos resultados.
Já lá vai o tempo em que a gestão de pessoas era apenas uma que
stão de “sensibilidade e bom senso”. Hoje os instrumentos de gestão de pessoas são tão rigorosos e precisos quanto os instrumentos de gestão da produção ou marketing, nomeadamente existem modelos matemáticos que garantem a correção de iniquidade e subjetividade das avaliações de desempenho com uma margem de erro inferior a 3%.
Porem a maioria dos instrumentos de gestão desempenho das nossas empresas e organizações hoje ainda é pouco mais do que empírico, e por isso poucos confiam neles.
Vejo com muita preocupação e frustração que o discurso crescente sobre méritocracia nas empresas não é acompanhado pela implementação de modelos de gestão de desempenho tecnicamente eficazes e contemporâneos, e por isso essa “méritocracia” não passará de uma “méritofalácia”.
Autor: Pedro M. Martins, CMC eVice presidente do IBCO